DIREITOnews | Intervenção federal não é ditadura militar
Na semana passada, pela primeira vez após a promulgação da Constituição Federal de 1988, um Presidente da República editou decreto de intervenção federal sobre uma das unidades da Federação. A partir de então, o Rio de Janeiro está sob o controle parcial das Forças Armadas, notadamente no que se refere à segurança pública, tendo sido afastado do cargo o Secretário de Segurança Antônio Roberto Cesário de Sá e posto em seu lugar o General de Exército Walter Souza Braga Netto.
Previsto a partir do art. 34, a intervenção federal é um dos três instrumentos previstos na Constituição Federal para confrontar casos de emergência ou calamidade, sendo mais brando que o Estado de Defesa e o Estado de Sítio. Nele, a União intervém em Estados, excepcionalmente, para a) manter a integridade nacional; b) repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra; c) por fim a grave comprometimento da ordem pública; d) garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação; e) reorganizar as finanças da unidade da Federação que suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior ou deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei; f) prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial; g) assegurar a observância de determinados princípios constitucionais sensíveis.
Em alguns casos, a decretação da intervenção dependerá de solicitação do Poder coacto, ou de requisição do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ou também de representação do Procurador-Geral da República, formalidades sem as quais não haverá a medida gravosa.
O decreto de intervenção, deve especificar a amplitude, o prazo e as condições de execução, não sendo instrumento irrestrito. Se necessário, será nomeada autoridade que fará papel de interventor, como é o caso do General Braga Netto.
Vale dizer que, na maioria dos casos, assim que publicado, o decreto de intervenção deverá ser submetido à apreciação do Congresso Nacional, no prazo de vinte e quatro horas, que aprovará ou rejeitará, pelo voto da maioria simples de seus membros. Rejeitado, os efeitos do decreto cessam imediatamente.
Portanto, ao contrário do que faz parecer, a intervenção federal não é um estado de guerra, em que as Forças Armadas tudo podem, lembrando os tempos de chumbo que o país viveu entre 1964 e 1985. Ao contrário, é um instrumento constitucional, com regras definidas pelo Presidente da República e controladas pelo Poder Legislativo. Assim, como sabemos que o Poder Legiferante foi o mais atingido pelo Regime Militar, por óbvio, o mesmo não permitirá um decreto que extrapole a razoabilidade.
Ademais, o decreto se limita à segurança pública no Estado do Rio de Janeiro e, portanto, o Governador do Estado continua no cargo, exercendo as funções de Chefe do Poder Executivo. O General terá sob o seu comando os efetivos elencados no art. 144 da Constituição Federal (polícia federal; polícia rodoviária federal; polícia ferroviária federal; polícia civil; polícia militar e corpo de bombeiros militares).
O decreto publicado na semana passada deixa claro que o interventor está subordinado, naturalmente, ao Presidente da República e que a intervenção durará até 31/12/2018, tempo considerado suficiente para controlar os problemas da segurança pública no Estado do Rio.
Por motivos técnico-jurídicos, alguns especialistas consideram o decreto assinado pelo Presidente Michel Temer inconstitucional, mas esse é um assunto longo que podemos tratar em outra hora.
Todavia, não há razão para espanto, haja vista que o remédio amargo tem previsão na ordem constitucional e visa o restabelecimento da segurança e do bem-estar da população, cumprindo com o papel nodal do Estado brasileiro.
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Eduardo Antunes é advogado e professor. Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Gama Filho, pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Gama Filho e pós-graduado em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes.